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(Crônica)

Feira de domingo

Esse domingo resolvi ir à feira de rua. Pedi o caldo e o pastel de carne. Fui vendo ele dobrar a cana e me lembrei dos vídeos no feed das redes.

Morro de medo dessa máquina. Essa que mói as coisas tudo nos vídeos. Mói borracha, ferro, mói carro.

Não sei se seria pior cair ali dentro e ser moído devagar, ou cair e não terminar de ser moído por inteiro.

Sempre que vou à feira, venho ficando com aflição pelo trabalho do moço que mói a cana. Embora o caldo seja sempre bom.

Não gosto de ver as vacas morrendo, nem o frango. Mas o churrasco é muito melhor se acompanhado com salpicão.

Prefiro o frango já moído, porque não fica pedaço. A carne moída tem papelão.

Não gosto que extraiam o leite da vaca. Mas o leite é bom. Não gosto quando o tio do caldo perde o dedo. Mas o caldo, esse, sim, é vegano e muito bom.

Mais vale a vaca viva e o tio com o dedo na mão, ou o caldo no copo, e o dedo, com sangue, no chão?

– Porra o meu caldo… – ‘Esse caldo de dedo, é vegano?’ pensei.

"Ah! Mas a vaca não escolheu ir pra fábrica." O tio não escolheu perder o dedo.

O caldo, com dedo, mesmo não sendo mais vegano, será que continua bom? – Não queria perder o domingo, já que não seria feito mais caldo naquele dia.

O leite tem cloro, dá gases, cólica, intolerância, e eu bebo mesmo assim, porque é bom.

Se der o leite à vaca, com chocolate, a vaca bebe? Ela deve até achar bom. E o tio do caldo? Bebe o caldo que moeu com o dedo dentro? Joga o caldo fora? Guarda, pelo menos, o dedo?

Já perdeu mesmo, porra. Quer que eu faça o que? Já perdeu o dedo. Senta aí no banco, tio. Larga pra lá esse dedo. Toma logo esse caldo, que tá é bom!

Rio de Janeiro,
Dezembro, 2023